domingo

o destino é lixado e levou a que estivéssemos os dois a cruzar a mesma esquina da mesma rua da mesma cidade no mesmo minuto.
inconfundíveis, as mãos nos bolsos, os olhos atentos, a frieza nos gestos, as mesmas hesitações cobardes.
acho graça a essas mãos, que sempre repousaram no meu colo e que me puxavam com ganância, agora tão contidas e cautelosas como se não fosse natural puxares-me para junto de ti
acho que foram os 30 segundos mais longos da minha vida. acho também que não respirei durante todo o tempo.
que pena ainda me fazeres pôr tudo em causa. logo aqui que é o meu berço


terça-feira

passou um ano desde a última vez que te vi. estavas sentado no carro, ao meu lado, em silêncio. 
o vapor da tua respiração na noite mais fria do ano parecia uma mentira. e eu a chorar pateticamente, sei lá porquê.
lembro-me de sentir um peso estranho no peito e de não conseguir conceber a minha vida sem a tua adoração cega, sem as tuas mãos na minha cintura.
de não achar possível não voltares para ao pé de mim. eu que conheço cada tique do teu corpo, cada rasgão nessa pele quente
eu que te beijava os olhos quando choravas
eu que venerava cada atitude destrutiva e egoísta só porque era tua
eu que voltei para ao pé de ti assim que caíste. 

tu que não me perdoavas um dia longe de tantas saudades

estou triste de ter esta história que me pesa nas costas e que me puxa para baixo. queria não ter sido crente e ter tido outra história, com outra pessoa, uma que não me enchesse de arrependimentos e rancores.
não minto: sei que sou uma pessoa pior depois de ti e que volta e meia te ligo nas noites de bebedeira, sem que isso me pese na consciência. digo-te que ela não te ama como eu e que tudo te vai saber a amargo assim que te apercebas. explico-te que ainda me dói o corpo todo quando te imagino a dares passeios de carro com ela, ou tudo o resto que não quero nem escrever. 
todos esses clichés, todas essas parvoíces, e eu no meio, já sem vontade de os contrariar